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21
Nov19

Partilhar ou intervir?

publicado por júlio farinha

   Quem escreve e publica por prazer e o faz bem e, se para além disso, confere substância, ideias,  sentimentos, e alguma arte áquilo que transmite, dizemos que está a partilhar. Na circunstância, achamos que deve haver o bom gosto conferido pela correcção, rigor e alguma estética da escrita, de tal modo que se cative o leitor e o prenda à leitura. Manda, porém, o bom senso que se tenha em conta a heterogeneidade dos utentes da plataforma - neste caso as características dos bloggers.

   Quem escreve, fá-lo para alguém. Daí o sentido da afirmação de partilha. De facto, quando se publica algo é com a intenção que isso seja lido. Senão, se escrever só para mim próprio, estou presente perante um acto puramente narcísico e o melhor é guardar o tal manuscrito no fundo da gaveta; sendo que ninguém nos tirará o prazer de escrever ... para si próprio. E ninguém aceita a partilha do que quer que seja se não se gostar ou, pelo menos, estar receptivo aos dados da troca. 

   Partilhar é um sintonizar na mesma onda. Dá-se e recebe-se, normalmente com agrado, um ou mais objectos. Neste caso, o texto ou objecto da partilha agrada a ambos os interlocutores no seio da mensagem, podendo serem eles vividos de modo diferente pelo emissor ou pelo receptor. De qualquer maneira, a prosa, a poesia, o quadro, o vídeo e a fotografia entram em casa do receptor. Senão, pode dar-se o caso de ficarmos isolados. Ter prazer no que se escreve convoca a necessidade de haver semelhante prazer em quem lê.

   É comum alguns fazedores de texto dizerem que escrevem por mero prazer. Certo. Eu gosto de escrever. Isso dá-me vida, mas também me dá gozo saber que sou lido. Todo o acto de partilha deve, a meu ver,  ser participado e comungado. Criticamente, é claro. É natural que haja gente que não gosta do que escrevo ou que gostem mais disto ou daquilo. Aqui não se pode falar em partilhar. Ficaremos sempre na dúvida se é aquilo que escrevemos que não presta, ou se é quem lê que discorda ou acha os nossos textos insalúbres.

   Assim, sem presunção, afirmo que escrever é como a música de intervenção. Não há nada de mais estimulante e transformador do que uma boa e revolucionária ideia. Então, entre as palavras "partilhar" e "intervir", não sendo antónimas, gosto mais da segunda. Intervir é um acto intencional, modificador de circunstâncias, provocador de mudança.. A intervenção altera, muda, transforma, faz do velho o novo. Não é por acaso que os comentários contraditórios do Sapo são mais ricos que os simples actos escritos de partilha. O comentário de intervenção exige debate, o de partilha nem por isso.

   É certo que um simples "Bom dia" ou uma despedida com "Beijinhos" (que até eu uso) são reservas de partilha, buscadas na intervenção,  na medida em que partilhamos uma saudação, um toque de ânimo e de simpatia. Coisas tão escassas nos dias que correm. São, se carregados de puro sentido, sinais de afecto - coisas de que todos nós precisamos. Em suma, partilhar e intervir são dois domínios diferentes de uma mesma realidade.

   José Mário Branco partilhava connosco a sua bela e cuidada música e nem por isso deixava de intervir sobre as nossas emoções, sobre o nosso intelecto,  com os seus textos e acções. Partilhava e intervinha.

   Dito isto, façamos da partilha uma intervenção rica e duradoura e assim nos podemos encontrar "com aquilo que temos para nos dar" (J. Mário Branco)

   

   

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